sexta-feira, 27 de abril de 2012

Yagin, Hominick e Immanuel Kant


Na madrugada de 22 de abril de 2012, no UFC 145, enquanto esperava pela luta principal do evento, “Jon Jones vs Rachad Evans”, assistia, como de praxe, às lutas que a antecediam. Uma delas, em particular, me chamou muito a atenção. Nem tanto pelos protagonistas, pois os lutadores nunca foram de me entusiasmar muito. Em razão disso, não esperava grandes coisas dessa luta e acabei sendo surpreendido com um belíssimo espetáculo.
Mark Hominick, canadense originário do Kickboxing e Muay Thai, passou a ter destaque em sua carreira no MMA quando passou a lutar, em 2009, no extinto WEC (incorporada recentemente pelo UFC em 2010), uma prestigiada organização dos pesos leves. Fez três lutas vencendo todas e começou a despontar como promessa. Já no UFC, vence sua primeira luta com um  ex-parceiro de treino e lhe é, então, concedido o direito de lutar pelo cinturão da categoria. O único problema era (e continua sendo...) que o campeão costuma responder pelo nome de José Aldo. Acho que não é necessário explicar, né! O resultado, bem, acho que todos conhecem. José Aldo venceu por pontos na casa dele (Canadá) e, ainda por cima, deixou uma lembrança bizarra em sua testa. Foi necessário tranquilizar sua esposa pela TV, dizendo que estava tudo bem. Perdeu, também, sua luta seguinte, tida como fácil, para um coreano com um inesperado knock out em 7 segundos. Seu próximo adversário: Eddie Yagin.
Eddie “The Filippino Phenom” Yagin é havaiano (conterrâneo de B. J. Penn), faixa marron de jiu-jitsu com bons conhecimentos das lutas em pé.  Com boa passagem em torneios de ponta como WEC e Bellator, Yagin assina com o UFC perdendo logo na sua estreia para o brasileiro Júnior Assunção no UFC 135, em setembro de 2011. Seu próximo adversário: Mark Hominick.
No momento em que os dois ficaram frente a frente é que foi possível perceber a diferença de altura entre ambos. Não que essa diferença fosse preocupante, mas ela existia sim e era considerável. Ah! Já comecei a imaginar Hominick controlando a luta à distância com jabs em razão da sua vantagem com a envergadura e sempre com o direto preparado. Uma luta teoricamente fácil e para voltar a ganhar. Ledo engano...
Foram três rounds de arte bruta com predominância do Boxe, não por acaso também conhecido como a “nobre arte”. Em muito, me lembrou a luta entre B. J. Penn e Nick Diaz, já comentada por esse mesmo escriba nesse mesmo blog.
No primeiro round, Yagin conseguiu, admito, surpreender-me a tal ponto que, de deitado no sofá, passei a sentar-me e, de repente, estava andando pela sala com as mãos na cabeça como que desacreditando naquilo que via. O gigante perdendo para o pequeno, o menor batendo no maior, o mais “fraco” dando uma boa lição no mais “forte”. Yagin deu uma surra daquelas em Hominick (quase que) apenas com a mão esquerda. O round todo, bateu “doído” (como se diz na gíria) com a esquerda e os médicos precisaram entrar para avaliar no intervalo. Hominick ficou bem feio e também não estava acreditando no que via. Foi um round de um lado só (para Yagin), inclusive com direito a knock down. Durante todo o round, Yagin foi o gigante imbatível e curiosamente de um golpe só, enquanto que Hominick fazia o papel de um garoto assustado e inseguro. Na minha imberbe opinião: 10x8 para Yagin. Ainda voltarei a esse round...
No segundo round, Hominick finalmente entra na luta e equilibra as coisas. Round discutível. Na minha pontuação deu empate: 10x10. Mas não seria injusto, penso, se algum juiz enxergasse vitória para alguém.
Terceiro round, Yagin começa a sentir o gás (na realidade, a falta dele) e passa por alguns maus momentos. Isso significa que o Yagin também vai ter que passar por um martelinho de ouro logo após a luta. Tudo bem. Alguns vão dizer: - Ah! Mas foi uma luta de boxe... Eu responderia: - Sim... e que luta...!!! Que primeiro round!!!!!!!!  O que foi aquilo???? Yagin deve ter pensado diferente: que seria capaz de vencer a envergadura de Hominick se tivesse velocidade, ou seja, com um bom e velho “bate-e-sai”. Isso me fez lembrar... de Immauel Kant, mais precisamente do texto “Que é esclarecimento?” que consistia em uma tentativa de resposta à própria pergunta.
Para Kant, esclarecimento é “a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a direção de outro indivíduo”. Assim, se a causa dessa incapacidade estivesse na falta de coragem de servir-se a si mesmo sem a direção de outrem, seria, então, o próprio homem, culpado pela sua situação de menoridade intelectual. Só estaria livre de culpa se a causa estivesse na própria falta de entendimento.
No entendimento de Kant, é bem complicado desvencilhar-se da menoridade na medida em que ela passou a ser interpretada como uma espécie de natureza. 
Yagin, ao protagonizar um primeiro round como aquele, deixou sua menoridade para trás para tornar-se uma pessoa esclarecida. Tendo a coragem de fazer uso de seu próprio entendimento sobre a luta e desenvolvê-la a seu modo, venceu por pontos de forma arrebatedora, emocionante e (porquê não?) esclarecedora... 
Yagin, o esclarecido.......