quarta-feira, 25 de junho de 2014

Kevin Souza vs. Mark Eddiva: Caos Determinístico ou Teoria de Probabilidades?


No TUF Brasil 3 – Finale: Miocic vs Maldonado, realizado aqui em São Paulo em 31 de maio de 2014 no Ginásio do Ibirapuera, teve uma luta, em especial, que conseguiu me deixar pasmo, boquiaberto, perplexo, maravilhado, também surpreso, mas, curiosamente com relação a esse último adjetivo, nem tanto. Explico: Kevin Souza era um lutador que já vinha do Jungle Fight (inclusive como campeão da categoria até 66 quilos). Reconheço que antes da sua estréia no UFC contra Felipe Sertanejo (UFC BH-2), só tinha assistido a uma luta dele, a saber, a do cinturão do própio Jungle Fight contra o Fabiano “Soldado”, após alguma pesquisa. E digo mais: Especificamente naquela luta, Kevin Souza tomou um knockdown do Fabiano Soldado em menos de um minuto de luta e ficou praticamente 4 minutos no chão, mais tentando se levantar do que jogando por baixo. Quando se levantou, faltando 20 segundos para o término do 1º round, soltou a mão duas vezes: na segunda, colocou o adversário para dormir. Como não conhecia o lutador, acho que devo ter soltado algo como: “Putz, conseguiu!”.
Digo essas coisas porque tem gente por ai que, basta um lutador ficar famoso para falar que já conhecia há muito o atleta, que sempre acompanhou sua a carreira e coisas do tipo. Bem, uma vez ou outra, tudo bem, a gente acredita. Mas quando reproduz esse comportamento ad infinitum, será que o farsante não é capaz de perceber o próprio engodo?
Mas, voltando ao assunto, a estréia do Kevin Souza, em razão de também não ter criado, pelo menos em mim, uma grande expectativa, acabou me causando as melhores impressões. Foi uma surpresa extremamente agradável e bem-vinda!!! Ah! como é bom rever nossas impressões e percepções sobre algo ou alguém que foi capaz de nos surpreender e de forma tão positiva!!!
No UFC BH-2, Kevin Souza entrou no lugar de Sam Sicilia, que teria se machucado, e mostrou para o que veio, aproveitando, portanto, a oportunidade recebida. Que lutador! E que estilo! Anulou completamente o Felipe Sertanejo com seu boxe provocativo a la Jungle Fight, que não tinha aparecido na primeira e única luta que tinha visto dele. Não respeitou nem um pouco o adversário que já tinha um certo nome no evento: um transgressor. Adorei a luta e o lutador! Logo pensei: é dos meus...
Segundo declarou na internet, seu nome era para ser apenas Kevin Souza. Mas como seus pais trabalhavam muito, foi sua avó quem foi registrá-lo no cartório. Mas como sua avó teve, quando jovem, um namorado chamado Edimilson, acabou registrando-o como Edimilson Souza e, ainda por cima, não contou para ninguém. Somente depois de dois meses, quando precisou levá-lo a um médico que sua mãe percebeu na certidão de nascimento que seu nome não era Kevin. Hoje, poucos o chamam de Edimilson, esse baiano, da terra do Boxe no Brasil, que para evoluir no MMA foi para Florianópolis treinar com Thiago Tavares e cia.
Já na sua segunda luta marcada contra o filipino Mark Eddiva, já esperava bem mais de Kevin Souza, pelo menos aquele seu estilo abusado (ou chamem como quiser) que aprendi a admirar nele que, de alguma forma, me remete a lutadores com Spider Silva e Jon Jones.
Meu amigo! Que luta! Mark Eddiva também não veio para brincadeira... Que lutão...!!!! Tá louco, meu!!!
Resumo do 1º round:
·      Kevin começa com alguns golpes a linha de cintura;
·      Eddiva solta um chute alto;
·      Num contra-ataque, Eddiva faz um knockdown em Kevin e fica por cima batendo, até Kevin se levantar, faltando 2:27 para o término do round;
·      A partir daí, começa uma verdadeira guerra: Por um lado, Eddiva com seus chutes baixos e, por outro, Kevin com seus diretos e cruzados;
·      Eddiva ainda teve um ou dois bons momentos (em um deles abriu um corte na testa de Kevin que chegou a balançar). Mas, Kevin teve vários bons momentos, chegando a deixar Eddiva bem atrapalhado nos últimos segundos do round. Minha impressão era de que mais uns 10 ou 20 segundos, Eddiva beijaria o chão. A torcida ficou de pé!
Caro leitor, fiquei confuso! Que luta! Bons momentos para os dois lados! Alguém ia cair! Quero dizer, achava que alguém poderia cair! Ou pelo menos achava que era o resultado mais provável! E isso me instigava mais ainda! Se alguém ia cair, quem seria? O brasileiro terminou batendo e isso é bom... Não sei. O filipino também é muito duro! O knock out era só uma questão de tempo? Em outras palavras, esse evento (o knock out em algum ponto de um futuro próximo) era determinístico? Ou, por outro lado, poderia ser caracterizado como um evento aleatório? Determinístico ou aleatório? Teoria do Caos ou Teoria das Probabilidades?
A Teoria Do Caos, tão conhecida pela frase “o bater das asas de uma borboleta em um ponto do planeta pode provocar um furacão do outro lado do mundo” (já li várias versões com vários países distintos), retrata bem as características dinâmicas e determinísticas dessa teoria. 
Formalizada por Edward Lorenz em 1963, é uma teoria que ajuda a lidar com problemas nos quais a instabilidade (que é elemento intrínseco do problema) surge em decorrência da sensibilidade das condições iniciais. Assim, os resultados são ditos “instáveis” com relação às equações dos modelos estimados (seus parâmetros e variáveis), no contexto de sistemas dinâmicos.
Por sistemas dinâmicos, devemos ter em mente que estamos tratando de modelos que levam em consideração o fato de os resultados serem determinados tanto pela ação, quanto pela interação entre os elementos envolvidos, de forma aparentemente aleatória. Os exemplos são inúmeros: previsão meteorológica é o caso clássico (Edward Lorenz criou essa teoria quando lidava com problemas de previsão do tempo).
A importância da instabilidade dos resultados é tamanha que mesmo os sistemas determinísticos, isto é, em sistemas nos quais as leis de evolução estão muito bem definidas, acabam produzindo resultados que, na prática, são imprevisíveis ou aleatórios, ainda que esses sistemas não tenham sofrido perturbações de início. Esses sistemas são aqueles que são conhecidos como “Caos Determinísticos”.
Nessa área, existe uma gama de pesquisadores que procuram provar exatamente isso, isto é, que o acaso (da Teoria das Probabilidades) não existe, seriam apenas fenômenos descritos por algumas equações não-lineares ou em razão da existência do grande número de interações entre os componentes.



Mas, enquanto isso não for provado, existe toda uma área já muito bem desenvolvida e difundida (inclusive entre os próprios cientistas) e que ajuda a resolver inúmeros problemas práticos: a Teoria das Probabilidades, que nasceu da prática de jogos de azar. Na realidade, o pressuposto é que os eventos de interesse são considerados aleatórios, no sentido que você até pode conhecer todos os possíveis resultados associados ao evento, mas não consegue determinar, qual é o resultado que, de fato e indubitavelmente, vai ocorrer. Se esse for o caso, é possível, então, considerar essa variável como aleatória e toda uma vasta teoria pode ser utilizada.
Diz a lenda que um nobre e jogador francês, Chevalier de Méré, preocupado em não ter seu dinheiro confiscado em alguma autuação “policial” de sua época, pediu a Pascal ajuda sobre um problema, que, depois, em cartas com Fermat, estava formulado da seguinte maneira:

Suponha que existam, ainda, m jogos para que o primeiro jogador ganhe, enquanto que existem n ao segundo jogador, sendo que m e n maiores ou iguais a 1. Se o jogo for interrompido antes do fim, nesse momento, de que maneira deve-se dividir o montante das apostas entre os dois jogadores e de forma mais justa? (A solução foi devidamente alcançada).
Ah! sim, voltemos ao 2º round! O nervosismo estava a mil!

·      Eddiva volta a soltar uma sequência de chutes baixos, todos bem fortes, quando de repente solta um chute alto na cabeça de Kevin, que impressionou;
·      Kevin, agora, começa a se desviar dos chutes de Eddiva e solta mais as mãos;
·      Eddiva usa os chutes baixos para não deixar Kevin se aproximar. Mas quando Kevin conseguia se aproximar, os socos tinham endereço certo;
·      Os chutes de Eddiva eram cada vez mais freqüentes e mais fortes. E quando pegava, Kevin parecia acusá-los;

Ah! Em instantes como esses, é difícil ter certeza de alguma coisa...

·      Kevin andava ainda mais para frente, só que mais devagar e já sem tanta fluidez;
·      Faltando pouco mais de 1 minuto, uma bom momento para Kevin. O direto não pegou em cheio, mas o cruzado “entrou”;
·      Faltando 30 segundos, Kevin iniciou um verdadeiro bombardeio contra Eddiva;
·      Faltando 10 segundos, Herb Dean interrompe a luta.

Ufa! Kevin Souza venceu... a incerteza acabou e o sofrimento sumiu... Agora... com relação à discussão anterior entre Teoria do Caos e a Teoria das Probabilidades, não faço a menor idéia de como isso vai terminar, sé é que essa discussão termina algum dia...

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Minotauro, Roy Nelson e Soren Kierkegaard


O resultado da luta principal do UFC Fight Night: Nogueira vs Nelson, realizado em Abu Dhabi em 11 de abril de 2014, deu o que falar por parte tanto da imprensa especializada quanto pelos fãs de MMA em geral (e do nosso querido Minotauro, em particular).

É claro que ninguém gosta de ver um ídolo como o Minotauro perder, ainda mais da maneira como foi. É como se fosse um mix de sensações como tristeza, desconforto, desilusão, abatimento, aperto e por ai vai... Mas é possível entender! Minotauro nos deixou mal-acostumados. É raro encontrarmos em seu cartel derrotas por knockout. Na realidade foram apenas duas: A primeira para Frank Mir e a outra para Cain Velasquez. Para Frank Mir, parece que Minotauro estava se recuperando da bactéria do suor, que pode causar infecção generalizada, amputação de membros e, inclusive, levar a morte. Já contra Cain Velasquez, a luta estava lá e cá, como se costuma dizer. Mas, Minotauro entrou com um jab e Velasquez aproveitou seu movimento de esquiva e cruzou com a direita. Peso pesado é assim mesmo: entrou a mão, tem que descer! Parabéns ao Velasquez, e a vida continua! Mas, foram apenas essas duas vezes que nosso Minota tinha sido pego na trocação. Rever essas lutas era como encontrar um material “raro” dele...

Mas aconteceu de novo... E, desde o início, parecia que as coisas não estavam boas para ele. Mas, por outro lado, essa é uma típica situação da qual já nos habituamos e, inclusive, é sua marca registrada. Minotauro costuma fazer lutas extremamente emocionantes, com várias reviravoltas, que, em geral, não são recomendadas para os cardíacos.

Mas não tivemos as reviravoltas... Ao todo, contabilizei três momentos ruins que foram definitivos para o fim da luta ainda no primeiro round:

  • Um uppercut que, deve ter entrado em cheio, tanto que, no momento seguinte, Roy Nelson, ao perceber que Minotauro teria sentido o golpe, soltou um over hand de direita;
  • Outro over hand de direita, faltando, agora, 1:55 min para o término do primeiro round;


  • Ao notar claramente que nosso Minotauro cambaleava, Roy Nelson, aperta o passo e, novamente com um over hand de direita, encerra a luta.


Os dois primeiros golpes levaram a knockdown. O derradeiro levou a knockout. A partir daí, o que se viu e ouviu foi um festival de críticas e julgamentos, todos num mesmo sentido e direção: aposentadoria. Até Dana White, o “big boss” do evento que, em razão de sua vaidade, se comporta mais como se fosse o “big boss” do esporte, deu seus pitacos. Na revista Tatame de abril, saiu uma declaração sua que intitulava a matéria: “Não quero vê-lo lutar nunca mais”.

Bem, em primeiro lugar, duvido que a aposentadoria nunca tenha passado pela cabeça do Minotauro. Em segundo lugar, julgar o outro, ou alguém, é muito fácil. Aliás, é o que a gente mais faz durante o dia. Tudo o que vemos, observamos, ouvimos, lemos etc, passa pelo crivo do nosso julgamento. Sempre achamos alguma coisa de qualquer coisa. Também, não é para menos. A capacidade (ou habilidade, se preferir) de julgar sempre foi uma aptidão extremamente valiosa de nosso instinto de sobrevivência. Sem ela, dificilmente sobreviveríamos na época das cavernas. Dessa forma, não me chama a atenção a quantidade de críticas e julgamentos que, desde então, o Minotauro vem recebendo. O problema nem ao menos é esse. 

O problema, na realidade, deveria ser deslocado daquilo que as pessoas acham para aquilo que o Minotauro acha ou tem a dizer! Se ele quiser se aposentar agora, basta anunciar. Se ele não quiser, quais são os motivos que o levam a querer continuar a lutar? É ai que deve estar o debate. Mas as pessoas preferem falar ao microfone (julgar) mais do que passar o microfone para quem deveria falar algo (ouvir). A primeira habilidade faz parte do instinto de sobrevivência. Já a segunda não. É mais para quem gosta de pensar, refletir, enfim, para quem não se contenta, apenas e tão somente, em ficar emitindo julgamentos. 


Esse tipo de gente costuma ser mais solitária, uma vez que começa a pensar mais por si própria já que suas dúvidas, incertezas e curiosidades são outras. Que razões levam nosso querido Minotauro a escolher continuar lutando? Escolha individual, responsabilidade angústia. Me faz lembrar Jean Paul Sartre e o existencialismo francês. Mas vamos tratar, aqui, do dinamarquês Soren Kierkegaard, um dos precursores do existencialismo de Sartre.

Kierkegaard foi o sétimo filho de um casal já em idade avançada para a época. Referia-se, frequentemente, a si próprio como “filho da velhice” e caso não fosse tão boêmio e indisciplinado teria, provavelmente, seguido a carreira de pastor. Com um pai extremamente religioso, sentimentos conflituosos tais como angústia, ansiedade acompanharam suas obras.


Em Kierkegaard, as escolhas (pessoais) constituíam uma das peças fundamentais de sua filosofia, uma vez que era por meio da realização daquelas (escolhas) é que o nosso autoconhecimento e responsabilidade pessoal seriam possíveis. Kierkegaard chegou a afirmar que o sentimento de angústia seria um modo de salvação para a humanidade. É a angústia que colocaria o ser humano diante de suas possibilidades de escolha, retirando-o de uma situação de imediatismo não-autoconsciente para uma reflexão autoconsciente. Somente através de uma experiência angustiante é que um indivíduo poderia se tornar verdadeiramente consciente.

E mais. Kierkegaard vai além: segundo ele, a única forma de lógica que as escolhas poderiam possuir é de ordem psicológica: o que um indivíduo faz depende daquilo que ele quer, do que ele escolhe, e não daquilo que ele compreende. Contudo, cada escolha envolve um risco em função da incerteza inerente. Assim, existir, do ponto de vista de um indivíduo consciente, é escolher-se e uma escolha deve fazer sentido para quem escolhe. Se a escolha de A não faz sentido para B, isso não é um propriamente um problema de A...

Minotauro... Estou contigo para o que der e vier!!!