Uma
luta em especial do UFC 11 (isso
mesmo, lá nos primórdios) representa um exemplo claro e evidente, dentre muitos
outros, de que o Brazilian Jiu-Jitsu encontra-se,
ainda, em franca evolução. Unicamente em razão desse motivo é que tomarei
partido em um certo problema bem conhecido dos lutadores profissionais de Jiu-Jitsu, a saber, o de lutar, ou não, na
final de um torneio com um companheiro de equipe. Mas vamos com calma...
Fábio
Gurgel, hoje líder e um dos fundadores da Alliance
Jiu-Jitsu, casca grossa da pesada e faixa preta de Jiu-Jitsu. Várias vezes campeão carioca, várias vezes campeão
brasileiro, várias vezes campeão mundial adulto, várias vezes campeão mundial master
e por ai vai... Bem, quem é da área conhece...
Seu
adversário era um Wrestler que praticava
já na escola e que depois foi treinar com os lendários irmãos Ken e Frank Shamrock, ambos também lutadores.
Na
tentativa de desenharmos a luta, temos um wrestler
e um lutador de chão. Wrestlers nunca
gostam de ficar de costas no chão, obviamente em razão de suas origens. (O
objetivo nessa modalidade de luta é colocar o oponente de costas no chão). Já
no caso do brasileiro, se isso acontecer, estará em casa. O fim da linha de um é o
começo da jornada do outro...
Nesse
caso, Fábio Gurgel sabe que é incrivelmente
difícil derrubar esse caras e que talvez fosse o caso de, em algum momento, aceitar
o jogo por baixo, raspar, cair por cima e buscar uma finalização. Desse modo,
as técnicas de raspagens eram fundamentais e deveriam estar em dia. E foi o que
se viu...
Mas tinha um porém. Naquela época (nos primórdios) valia segurar na grade. Fábio Gurgel, um brutamonte pra ninguém botar defeitos, lá pelas tantas, transformou-se numa verdadeira máquina de raspar. Mais lembrava um doido varrido. Mas o americano agarrava-se desesperadamente à grade em todas as tentativas de raspagem. Para termos uma idéia melhor, a disputa de força era tamanha entre eles que a própria grade do octógono chegou a arrebentar. A cena até hoje é bizarra. Resumindo, o americano ficou por cima quase o tempo todo e venceu a luta, mesmo não tendo feito muita coisa por cima...
Mas tinha um porém. Naquela época (nos primórdios) valia segurar na grade. Fábio Gurgel, um brutamonte pra ninguém botar defeitos, lá pelas tantas, transformou-se numa verdadeira máquina de raspar. Mais lembrava um doido varrido. Mas o americano agarrava-se desesperadamente à grade em todas as tentativas de raspagem. Para termos uma idéia melhor, a disputa de força era tamanha entre eles que a própria grade do octógono chegou a arrebentar. A cena até hoje é bizarra. Resumindo, o americano ficou por cima quase o tempo todo e venceu a luta, mesmo não tendo feito muita coisa por cima...
Mas
o curioso foi precisamente aquilo que o comentarista da luta Paulão Borracha passou a chamar a nossa atenção.
Nos dias atuais é uma coisa obvia, mas na época não era. Fábio Gurgel não colocava o pé na virilha, seja para fazer o triângulo, seja para empurrá-lo para
tentar se levantar. Naquela época, era um Jiu-Jitsu
meio que “puro” (se assim me permitirem dizer) que os lutadores levavam para o
octógono. Hoje em dia, o triângulo que
é ensinado nas academias de Jiu-Jitsu
tem como um de seus primeiros movimentos o pé na virilha. Isso significa que o MMA
(ou vale tudo para os saudosistas) transformou o Jiu-Jitsu (e continua transformando). O MMA, que teve o Jiu-Jitsu como seu criador, é quem vem modificando
o próprio Jiu-Jitsu. É a criatura
transformando e fazendo evoluir o seu criador!! Além do mais, não sei dizer se
há alguma modalidade de luta que em 20 anos tenha evoluído tanto quanto essa. Boxe? Muay Thai? Wrestler? Não
sei... Eu não acredito...
São
duas coisas que devem ser levadas em consideração: Se eles forem obrigados a
lutar, significa que um vencerá e possivelmente não venham a discutir e dividir
técnicas novas juntos, de inovarem, enfim, de treinarem juntos. A conseqüência imediata
é que o desenvolvimento trava. O público até ganha, mas a evolução do esporte fica
comprometida. Por outro lado, se um abre mão e aceita o segundo lugar, o
público pode não gostar, mas as condições para a continuidade da evolução do
esporte permanecem asseguradas.
É
claro que não existe uma resposta certa, verdade absoluta ou coisas desse tipo.
Posto o problema dessa forma, apenas opiniões podem ser expressas. Mas simpatizo
com a idéia (e mais ainda com a possibilidade) de presenciar a evolução de uma
arte marcial, testemunhar a forma como as coisas vão se transformando, os
atores envolvidos etc.
Mas
é curioso como encontramos paralelos na ciência. Esse problema de dividir ou
não com seus semelhantes uma habilidade original não é exclusivo de nós seres
humanos.
Os
macacos-prego são bem conhecidos em nossa terra, mas, até alguns anos atrás, eram
totalmente ignorados pela ciência em estudos do comportamento dos primatas.
Por
volta de 2004, pesquisadores do Brasil, Itália e Estados Unidos constataram
algo que beira o revolucionário na Biologia: os macacos-prego utilizam ferramentas
na vida selvagem e transmitem essas habilidades para as próximas gerações.
Não
que seja a única espécie primata a possuir essa habilidade. Nos anos 70, foi
constatado que alguns chipanzés transmitem culturalmente algumas habilidades
tais como o uso de vareta para pegar mel e apanhar formigas. Alguns gorilas
conseguem usar pedras e paus para quebrar cocos.
Segundo
a Biologia, até ai, tudo bem. Gorilas e chipanzés estão próximos do homem na
escala evolutiva. Mas, de acordo com a pesquisadora da USP Patrícia Izar, o macaco-prego encontra-se em tronco que divergiu há
pelo menos 40 milhões de anos e a idéia de que um parente muito distante conseguiu
desenvolver e usar ferramentas coloca em cheque toda a idéia de que a nossa
espécie seria a única detentora dessa capacidade.
Interessante
como tudo veio à tona. Imagens dos nossos simpáticos macaquinhos usando
ferramentas foram divulgadas mundialmente por acaso. Em 2004, um fotógrafo
britânico visitou uma fazenda turística no Piauí e presenciou macacos-prego levantarem,
até a altura da cabeça, uma pedra com apenas uma das mãos e atirá-la certeiramente
contra um coquinho no chão. A cena rodou o mundo, com direito a BBC e tal.
Nossos
pequenos e travessos piauienses ficaram famosos e importantes. Chegou ao ponto
do professor do Departamento de Antropologia Biológica e Anatomia da
Universidade de Duke Carel van Schaik
iniciar uma nova linha de investigação ao propor um modelo teórico que
explicasse o advento de culturas associadas ao uso de ferramentas. Em uma
conferência, afirmou que
“Se a cultura pode ser definida como uma inovação
seguida de transmissão social, estamos encontrando padrões sugestivos de que
estamos, sim, diante de culturas”.
Um
momento: Predisposição genética, dificuldades para obter alimento e
aproximar-se dos adultos para aprender técnicas? Carel van Schaik está se referindo aos nossos macacos-prego ou aos
nossos lutadores de Jiu-Jitsu? Agora fiquei na dúvida...
Especificamente
a respeito do terceiro fator, Eduardo
Ottoni, pesquisador do Instituto de Psicologia da USP, observa que “uma possibilidade é que os machos adultos
permitam a presença dos mais jovens e os deixem comer os restos como uma forma
de chamar a atenção das fêmeas”.
Ainda
sobre esse assunto, Patrícia Izar
levanta a hipótese de que a transmissão do uso de ferramentas teria a função de
manter a coesão social do grupo como um todo e não o de simplesmente matar a
fome.